Igreja Madre de Deus
A igreja Madre de Deus, no Bairro do Recife, teve o seu traçado elaborado pelo mestre-pedreiro Antônio Fernandes de Matos que, em 1679, contratou suas obras com os padres da Congregação do Oratório de São Felipe de Néri.
A construção do templo, no entanto, só veio a ser concluída em 24 de março de 1720, apresentando em sua bela fachada esculturas em pedras dos arrecifes e uma estátua de São Felipe de Néri em tamanho natural.
Para a construção da igreja foi aproveitado um banco de areia, que ficava no extremo sul da península de Recife, prolongado por outros aterros até chegar ao meio da atual Avenida Marquês de Olinda, doados pelo capitão Antônio Fernandes de Matos. Provisão régia de 15 de outubro de 1681 concedia a licença para a fundação de um convento, pelos padres de São Filipe de Néri, destinado a oito religiosos. Em 1688 foi o convento elevado à categoria de casa principal da ordem, ficando a de Olinda destinada a férias e convalescença dos padres enfermos. No convento funcionou, desde a fundação do primitivo hospício, um curso secundário completo de humanidades, como também superior. Em 1755, o governo metropolitano permitiu que os seus alunos fossem aprovados na Universidade de Coimbra sem exames. Funcionou também um curso público de Filosofia, possuindo sua biblioteca mais de 4 mil volumes, com obras de variados assuntos.
Com a extinção da Ordem em 1830, a Madre de Deus foi entregue a um administrador eclesiástico, que, pelos poderes que lhe foram conferidos pelo Decreto n° 49, de setembro de 1833, encarregou-se de distribuir entre as igrejas pobres do bispado todos os móveis e alfaias, executando-se o que fosse de outro ou prata e o que era necessário para ao uso da igreja. Em 10 de junho de 1835, com a Lei provincial n° 8, a Madre de Deus passa a ser administrada pela Irmandade de Santana.
Robert Smith, estudando o mobiliário de sua sacristia, cham a atenção para os armários de madeira, alçados típicos em molduras quadrilobadas, em estilo barroco do rei Dom João V (1706 a 1750). Medindo 230 cm x 213 cm e feitos de madeira rara de pau-de-rosa escuro, os quatro armários embutidos possuem dois tipos de desenhos distintos. “Um tem vinte gavetas para amictos, quadradas, colocadas por cima de dois compridos gavetões que, por sua vez, se apoiam sobre o espaço do armário, fechado por duas portas ricamente trabalhadas. No outro desenho há somente quinze gavetas para amictos na parte superior e os quatro compartimentos de baixo são inteiramente abertos, havendo um simples gavetão de fundo”.
Robert Smith atribui esta obra a José Gomes de Figueiredo, que trabalhou na Igreja de São Pedro dos Clérigos e no Mosteiro de São Bento de Olinda, possuindo os referidos móveis pernas tipo cabriolé e ornamentos com delicada filigrama de formas como as das gavetas. “Nas faixas em avental observam-se as superfícies cuidadosamente moldadas com conchas recortadas, envolvidas por alegres volutas, às quais são anexados cachos de uvas”.
Na descrição de Germain Bazin a “grande e bela igreja com sua larga nave, ladeada por corredores e tribunas, excepcionalmente amplas, foi construída numa única etapa, como demonstra a unidade do seu estilo, desde a capela-mor até as torres da fachada. A capela-mor, inteiramente revertida em talha pintada e dourada, estilo D. João V, grosseiramente executados e de parentesco bem próximo com os da capela-mor da Conceição dos Militares. Seis altares, em estilo rococó tardio, decoram a nave. A sacristia, situada atrás da capela-mor, contém um dos mais preciosos lavabos portugueses existentes no Brasil. É de mármore de Estremoz, combinado com mármore de cor”.
No conjunto do seu imaginário, destaca-se a escultura em cedro do Senhor Bom Jesus dos Passos, trabalho do metre-santeiro recifense Manoel da Silva Amorim (1793-1873), venerada em sua capela no interior da nave principal. Esta imagem anualmente participa das mais antiga procissão do Recife, a Procissão dos Passos da Paixão de Cristo, cujas origens remontam ao ano de 1654, quando da expulsão dos exércitos holandeses do território pernambucano. Ainda no corpo igreja, no altar ao lado esquerdo do visitante a imagem de São Filipe de Néri, fundador da ordem dos Oratorianos, encontrando-se na parte inferior, moldada em terra cota apresentando-se em posição de repouso, a curiosa imagem da Santa Maria do Egito (séc XVII).
Na primeira metade do século XX, dois pintores em atividade no Recife, trabalharam na igreja decorando o teto de sua nave e a pintura dos medalhões, representando os dose apóstolos. No teto da nave trabalhou Henrico Moser e nos medalhões Baltazar da Câmera.
Atingida por um incêndio em 1971, provocado por um curto-circuito, a igreja da Madre de Deus teve a sua capela-mor destruída pelas chamas. A imagem da padroeira, representada pela Sagrada Família, juntamente com o crucifixo da irmandade do Senhor Bom Jesus das Portas, cuja capela fora demolida em 1850, além de outras imagens e de todas as cabeças de anjos que adornavam o seu teto, transformaram-se irrecuperáveis. Restaurada sob a direção do engenheiro Ayrton Carvalho e do restaurador José Ferrão Castelo Branco, com a recomposição completa da talha da sua capela, foram reunidas outras imagens para compor o atual altar-mor.
Nos dias atuais, a igreja da Madre de Deus conserva no seu altar-mor as imagens de Nossa Senhora Mão dos Homens (séc. XVIII), ocupando a posição da Sagrada Família (destruída pelo incêndio), tendo do lado da Epístola, Santa Bárbara e São Frei Pedro Gonçalves (padroeiro da paróquia, cuja imagem é originária da igreja do Corpo Santo, desaparecida em 1913); no lado do Evangelho, Santa Úrsula e São Pedro Papa. No centro, acima do sacrário onde ficava a Nossa Senhora da Madre de Deus (Sagrada Família), foi colocado um crucificado em jacarandá da irmandade do Senhor Bom Jesus dos Passos. Os retábulos da capela-mor, pintados por Sebastião Ramalho da Silva Canuto, representam cenas da Sagrada Família – Anunciação, Nascimento, Adoração dos Magos, Adoração dos Pastores, Fuga para o Egito -; neste último o Menino Jesus aparece usando chapéu.
Uma imagem em pedra de Nossa Senhora da Conceição, que fora do Arco da Conceição, demolido em 1917, trabalho do escultor João Pereira (1746), que deveria se encontrar no corredor do lado esquerdo, encontra-se cedida por empréstimo ao Museu da Ordem Terceira de São Francisco do Recife.
No consistório da Irmandade do Senhor Bom Jesus dos Passos, a imagem primitiva da secular procissão encontra-se guardado dentro de uma vitrina em madeira torneada.
A torre sineira possui quatro sinos: dois fundidos e Pernambuco (1891), no oficina de Luís da Cruz Mesquita; em feito em Lisboa por Faustino Alves Guerra (1778) e um outro por Manuel Vicente Siqueira (1804), no Recife.
Na descrição de Maria Elisa Carrazoni, “o frontispício apresenta portas e janelas enquadradas por colunas e cunhais revestidos em pedras regulares. As portas e janelas possuem vergas retas e são ornadas por frontões interrompidos. Janelas do coro e janelas das torres abaixo da cornija reta com gradil de ferro. Ainda na fachada principal, acima das janelas das torres, há óculo lobulado vedado. O frontão em volutas é vazado por nicho no tímpano e encimado por cruz. As torres tem janelas sineiras em arco pleno, coroamento em cúpula de arestas, bulbo e pináculos. As janelas laterias das torres são iguais às da fachada principal e também encimadas por óculos. O interior da nave apresenta púlpito e tribulas com ornatos rococó. Altares colaterais ao arco cruzeiro, com retábulos em douração. A capela-mor possui teto, retábulo e paredes revestidas em talha, com dourações. O altar-mor em talha dourada é encimado por nichos, sacrário e trono do mesmo estilo. As tribunas, com balaústres e safenas. Portas ornadas por talha dourada. Há painéis emoldurados por talha dourada, O forro da sacristia, em entuque, acompanha o estilo do retábulo sobre a cômoda”.
Em prédio contíguo à Igreja Madre de Deus funcionou o Convento dos Padres do Oratório de São Felipe de Néri, também construído pelo mestre-pedreiro Antônio Fernandes de Matos a partir de 1679. Em 1825, com a extinção dessa ordem religiosa, foi o prédio confiscado pelo Governo Imperial, sendo o acervo de sua biblioteca transferido para a recém-criada Faculdade de Direito. No local, passou a funcionar, no ano seguinte, a Alfândega do Recife, retratada em gravuras de Emil Bauch (c.1852) e Lois Schlappriz (1863), a qual veio a sobre um grande incêndio em 26 de janeiro de 1916.
A Igreja Madre de Deus encontra-se inscrita como Monumento Nacional no livro das Belas Artesv. 1, sob o n° 188, em 0 de julho de 1938 (processo 134-T38).
Fonte
Silva, Leonardo Dnatas, 1945.
Pernambuco preservado: histórico dos bens tombados no Estado de Pernambuco / Leonardo Dantas Silva .-2. ed.- Recife: L. Dantas Silva – Editor, 2008.
272p. il.
inclui bibliografia
Histórico de 76 monumentos e quatro sítios históricos tombados pelo IPHAN no Estado de Pernambuco.
Pesquisado em Biblioteca do IPHAN de Pernambuco